"Resta que eles supõem nossa cumplicidade, contam com ela. Gritam seu ódio na nossa frente para que, todos juntos, constituamos um grande sujeito coletivo que eles representariam: "nós", que não matamos Isabella; "nós", que amamos e respeitamos as crianças -em suma: "nós", que somos diferentes dos assassinos; "nós", que, portanto, vamos linchar os "culpados".
Em parte, a irritação que sinto ao contemplar a turma do "pega e lincha" tem a ver com isto: eles se agitam para me levar na dança com eles, e eu não quero ir.
As turbas servem sempre para a mesma coisa. Os americanos de pequena classe média que, no Sul dos Estados Unidos, no século 19 e no começo do século 20, saíam para linchar negros procuravam só uma certeza: a de eles mesmos não serem negros, ou seja, a certeza de sua diferença social.
O mesmo vale para os alemães que saíram para saquear os comércios dos judeus na Noite de Cristal, ou para os russos ou poloneses que faziam isso pela Europa Oriental afora, cada vez que desse: queriam sobretudo afirmar sua diferença".
Da coluna do Contardo Calligaris de ontem, na Folha.
Escola Base
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